EU E A ALOPECIA, NO FINAL DO MÊS DA CONSCIENCIALIZAÇÃO

Não vou dizer que foi fácil quando recebi o diagnóstico final. Saí do consultório e chorei. Tinha de libertar o nó que me cresceu na garganta quando ouvi dizer que o meu cabelo não iria voltar a crescer. A minha filha estava comigo e sei que também sentiu um aperto no peito, porque me olhou profundamente e me apertou a mão. Foi ela quem me disse "vai correr bem" sem usar uma palavra. Já na rua, num final de tarde chuvoso e triste, chorámos as duas e percebemos que um novo desafio estava a chegar.

Não há forma de reverter os sintomas da  Alopecia Cicatricial, apenas medicação para atrasar a queda, para a controlar durante toda a vida. Aquela medicação que me faz mal e à qual já me tentei habituar por várias vezes ao longo dos mais de 5 anos de várias consultas, em 3 diferentes especialistas, à procura de um diagnóstico.

Não interessa agora todo o caminho passado, pois arrasta culpas que tive de largar para seguir em paz, para seguir em frente sem nós nem apertos, mas com gratidão no presente. Deveria ter descoberto mais cedo, poderia ter feito mais tratamentos, experimentado mais soluções... Não deveria ter descuidado tanto... Mas nada disto me ajudará a aceitar o que o futuro me irá trazer. Se é para mim, eu aguento!

Ainda naquele dia, consegui iluminar-me com a esperança de um transplante. A queda estava estagnada há cerca de um mês e, se assim continuasse durante 2 anos, poderia experimentar esse (caro) tratamento e tentar voltar a ter cabelo naquela vasta cicatriz. A tal medicação e nada de ansiedade e stress. Só 2 anos... "Vai correr bem", apesar de não haver garantias de que o corpo aceitaria o novo cabelo nem que o mesmo não voltasse a cair. Era uma luz e ajudou-me a ter serenidade até ao dia em que ficámos todos em casa de "quarentena". 

Nessa altura voltou a cair... Todos os dias, fios e fios. Cresceu, esbranquiçou e foi caindo. Já estava muito avançado antes de março. São muitos anos com espacinhos vazios, juntos, pegados, que se tornaram manchas enormes de careca, de cicatriz, de pista de patinagem para piolhos. 

Ao longo dos anos, fui descobrindo penteados para o esconder e sempre me senti incomodada com a possibilidade de alguém ver e comentar. Ganchos e elásticos têm sido uns amigos valentes. Um dos médicos até disse (um dia) que "por enquanto" podia fazer o "penteado de taxista"... (Naquele dia, doeu ouvi-lo... e ainda não sabia o que tinha.)

No início do verão, comecei a pensar em lenços e já experimentei algumas formas de os usar. Vou descobrir mais e hei de encontrar várias que me fiquem bem, mas tenho tempo. Ainda consigo proteger a careca do sol com os fios que, agradecidamente, me fazem companhia. Ainda gosto de me ver assim... Adoro os branquinhos, sou grata por tê-los e cuido deles para se manterem em ponto de neve. Ainda vou acertar as pontas, para me livrar dos restos de tinta e conseguir um aspeto mais saudável. Todos os dias, quando recolho os muitos cabelos que se espalham por todo o lado, agradeço porque os tive, porque os adorei e me ajudaram a sentir-me mais bela. Agradeço por um dia na sua companhia.

Mas também já descobri mulheres lindas sem qualquer cabelo. Já percebi que conseguem continuar a ser interessantes, sensuais, com boa apresentação. Já percebi que a maquilhagem ajuda e que a confiança e a certeza que se sente por dentro transparecem no brilho das cicatrizes, fazendo com que o cabelo não tenha assim tanta importância. Já aceitei que assumir a nova realidade é um passo de vitória e que me tornará uma mulher mais forte e única. 

Por tudo isto, e ainda por existirem cabeleiras fantásticas (mais baratas do que um fim de semana para aliviar o stress), posso dizer que o futuro não me assusta e que sei que o caminho é aproveitar um dia de cada vez e, fio a fio, dizer que me amo de qualquer jeito e que vou continuar a ter uns olhos lindos e um sorriso luminoso.



Este é o meu lado esquerdo. Não é o menos nem o mais afetado. É o mais antigo, por onde começou a queda. Um dia mostro o resto...



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