COISAS DA MINHA INFÂNCIA DE QUE SINTO FALTA


São muitas as coisas da minha infância de que sinto falta. Mesmo!
Penso até muitas vezes que gostaria de voltar àquela fase, à época mágica que foi, para reviver os acontecimentos e as pessoas que entretanto perdi.

Sinto a falta da minha avó Delmira, que perdi no começo da adolescência. Faz-me falta o seu sorriso, a sua voz, a macieza da sua pele, as conversas e os mimos, as gargalhadas, a atenção...
Sinto a falta de jogar com ela e com o avô às cartas, de lhe ler as legendas dos filmes, de lhe comprar rebuçados de mel no »Retiro Azul». Tenho saudades de ir com ela ao café, de participar nas excursões dos "idosos" e de a ouvir cantar fado.
Sinto a falta de a ter como companheira da minha mãe. De as ver juntas, tantas vezes amigas e cumplices, tantas no colo uma da outra.
Sinto a falta de brincar às lojas com os seus botões e linhas, de calçar os seus sapatos pequeninos e me vestir com os seus xailes.
Sinto a falta de dormir com o avô para deixar a mana dormir com a avó. Sinto até saudades de a ouvir ralhar comigo por estar a fazer mal à nossa «santinha», como ela docemente a tratava.

Sinto falta de andar da escola primária, de ter a tarde toda livre para brincar, de ir a pé e poder faltar quando chovia torrencialmente. (Tão bom ouvir a minha mãe dizer baixinho que podia ficar na cama quentinha!)
Sinto falta de chapinhar nas poças de água com as botas de borracha, de brincar no parque e me pendurar de cabeça para baixo nos ferros, de obrigar o meu irmão e o Miguel a comer as papinhas que eu e a mana fazíamos esmagando as frutas que apanhávamos.
Sinto a falta da minha mana sempre comigo, das brincadeiras, das confissões, das brigas. De dormirmos lado a lado e de perceber que adormecera a ouvir-me falar. Sinto saudades de ser a sua professora, escrevendo letras e números na porta do quarto (com giz trazido da escola). Sinto a falta das passagens de modelos, de brincarmos "às irmãs" e aos escritórios, de vermos juntas os desenhos animados ao sábado de manhã.

Sinto a falta de apanhar fruta selvagem, de correr até ao ribeiro, de descobrir caminhos na serra e de brincar às casinhas na rua. Sinto saudades de ouvir a minha mãe chamar por nós para irmos almoçar. Sinto saudades de irmos apanhar flores, para fazer com elas arranjos com que enfeitávamos a casa. E de apanhar caracóis ou pinhas e pinhões.

Sinto falta dos petiscos que o meu pai fazia ao domingo, como lanche ajantarado, que comíamos a ver o MacGuiver. Tenho saudades de ir ter com ele aos CTT e de ir aos bailes vê-lo tocar, orgulhosa, aproveitando para dançar, copiando a minha mãe.
Tenho saudades de lhe fazer penteados e maquilhagens ou massagens nos pés, de estrear contente as saias que me fazia, de a ajudar a dobar a lã que usava nas nossas camisolas, de bebermos juntas café com leite a acompanhar as torradas, da alegria de saber que confiava em mim para ir às compras ou tomar conta do meu irmão.

Sinto falta dos tabuleiros de castanhas e batatas doces assadas em noites de ventaval, das fogueiras e do convívio pelos santos populares, da família toda reunida pelo Natal, de me mascarar e foliar durante quatro dias pelo Carnaval, de ir de barco para Troia com a minha mãe e irmãos, sabendo que na «hora da digestão» estaríamos no parque à sombra a brincar.

Sinto saudades de quase não ter responsabilidades e de ter muito tempo para estar sem fazer nada.
Sinto falta da minha infância feliz!


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